Como a participação ativa transforma políticas públicas

Opinião de Ísis Capucha – Gestora de Projeto ComParte

Executive Digest
Setembro 12, 2025
10:39

Por Ísis Capucha – Gestora de Projeto ComParte

Ouvi, ao longo dos anos, inúmeros jovens, alunos e pessoas migrantes/refugiadas dizer que “quando somos ouvidos e nos fazem perguntas, fazemos parte” (Pró1). Vivemos tempos em que um dos maiores desafios à democracia é a distância entre os cidadãos e os decisores políticos e, quando o envolvimento cívico não é assegurado pelos mecanismos de participação que existem, repensar a forma como desenhamos e implementamos políticas públicas é essencial.

Não incluir as vozes de quem vive as políticas públicas no seu processo de desenho e tomada de decisão acaba por correr o risco de ser socialmente irrelevante e, por isso, pouco eficiente. Apesar de ser um processo mais demorado e complexo, sabemos através dos Prós que, quando se pergunta a opinião dos cidadãos sobre as decisões, é mais fácil fazer corresponder as suas reais necessidades e objetivos às políticas e oportunidades que se oferecem. Isto implica envolver os cidadãos desde o início, não só como meros destinatários ou espectadores num processo já decidido, mas como parte da solução e como pessoas que são capazes de contribuir para algo. Efetivamente, jovens e pessoas migrantes e refugiadas em Portugal têm partilhado que “faz a diferença quando podemos dizer: fui eu que fiz aquilo”, que sentem que fazem parte “quando tentam pôr em prática as nossas sugestões e valorizam as nossas diferenças e preocupações”, ou “quando ajudamos a construir coisas” (Pró1).

Participar ativamente pode transformar comunidades, instituições e políticas, especialmente quando falamos de públicos cuja voz, por norma, não é ouvida nem integrada nos processos de tomada de decisão, como é o caso de jovens, pessoas migrantes e refugiadas em Portugal, moradores de bairros periféricos ou pessoas com experiências de vida fora do centro. Mais uma vez, como tenho ouvido muitos jovens e pessoas migrantes e refugiadas partilhar, “quando estamos envolvidos a sério nas coisas, estamos mais motivados”(Pró1), e isso, inevitavelmente, enriquece as políticas púbicas, tanto no seu processo de construção como nos potenciais efeitos que geram.

A participação é o ponto de partida, e vemos à nossa volta que é cada vez mais presente e valorizada a ideia de que “é bom quando a participação é legitimada e quando há estruturas e iniciativas participativas planeadas que amplificam as nossas vozes e experiências” (Pró1), como dizem vários jovens e pessoas migrantes/refugiadas. Não faltam exemplos desses casos: projetos desenvolvidos com escolas de elevada diversidade cultural, programas de integração cocriados com pessoas refugiadas, iniciativas de mapeamento de necessidades com públicos diversos ou laboratórios de co-construção em que se desenham soluções em conjunto, juntando técnicos, decisores e os próprios utilizadores dos serviços públicos.

Não podemos esquecer, porém, que a verdadeira participação é sinónimo de continuidade e de responsabilidade partilhada. Ou seja, para além de ser “importante ser-nos perguntado o que esperamos”, é também essencial, “ao longo do processo, sermos consultados e envolvidos nas decisões” (Pró1). Para isto, é preciso desmontar hierarquias e dinâmicas de poder, bem como criar espaços seguros onde todas as experiências contam e onde todos encontram as mesmas condições para contribuir.

Assim, a participação ativa exige método, ética, investimento, tempo, criatividade, diversidade de formas de expressão e afeto. “Criar ambientes inclusivos que valorizem a diversidade e que envolvam ativamente as pessoas” e em que é possível “participar para lá da perspetiva do «visualizador»” (Pró1)., vai muito além de ouvir testemunhos ou de fazer um questionário, implicando envolvimento nas várias fases do ciclo de política pública, devolver os resultados aos participantes e garantir que os seus contributos têm impacto. É preciso incluir esses pressupostos nas iniciativas de participação que se desenham, acreditando que esta transformação pode ajudar a um real fortalecimento da democracia.

Ver a participação como algo que faz parte da vida democrática é algo que faz falta em Portugal, especialmente no contexto social e político em que vivemos. Sabemos que já há quem o faça e que existe, em Portugal, um tecido associativo resistente, escolas abertas à inovação e uma crescente sensibilidade para a inclusão social, mas esta abordagem podia ser política de Estado. O “nada para nós sem nós” (Pró1) ganha outra relevância quando vemos a democracia mais fragilizada. Repensar os processos de tomada de decisão tendo a participação como base permite não só melhorar serviços, mas também fazer políticas públicas com mais afeto, criatividade e eficiência. Porque, e mais uma vez, como dizem jovens e pessoas migrantes e refugiadas, “a melhor forma para nos sentirmos em casa é isto: sentirmo-nos importantes, envolvidos e capazes” (Pró1).

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